NATAÇÃO EM ÁGUAS
ABERTAS E MARATONAS AQUÁTICAS
JAVIER
EDUARDO ORMACHEA DURAN - CREF 3626 G/RJ
Pós-graduando em Fisiologia do Exercício e professor de capacitação
para maratonas natação em águas abertas
O ser humano desde os primórdios de sua existência,
por necessidade de deslocamento, fuga, ou fins estratégicos utiliza-se
de técnicas de progressão aquática para atravessar cursos
de água, lagos, rios, praias, ilhas e todo um gênero de obstáculos
aquáticos ao seu caminho. Em tempos antigos também era vista, a
natação, como elemento de formação integral do ser
humano, treinamento militar e educacional.
- BREVE
HISTÓRICO
O nado para atravessar cursos de água sempre esteve presente
na história da humanidade, desde que o Homem existe a natação
também existe. O que foi acontecendo em certos povos, por necessidades
diversas, especialização de estilos de nado seja de formas utilitárias
ou de progressão silenciosa ou de fuga em velocidade, estes estilos foram
os mais variados possíveis ficando no anonimato cultural daquele povo
ou tribo, com o início de guerras entre povos. Os Fenícios foram
os primeiros povos a utilizarem a natação com um meio estratégico,
que lhe conferia grande vantagem sobre os seus oponentes, ainda sendo ensinado
de forma didática para treino dos soldados.
Em tempos da idade média ocorreu um grande recuo em função
da crença difundida de que a natação era um grande difusor
de doenças, fato difícil de ser vencido ao longo dos anos vindouros.
Nos jogos Helênicos encontram-se competições de nado onde
não se visava estilos e sim velocidade, não importando o tipo de
movimento. No começo dos jogos olímpicos encontram-se modalidades
diferentes e no pós II Guerra Mundial já estão estabelecidos
os quatro estilos, sendo o nado Crawl utilizado nas provas mais velozes, classificadas
como estilo livre, tendo sua origem peculiar em tribos de indígenas australianos,
aprendidos por um professor que posteriormente foi residir nos Estados Unidos
da América, e melhorando seu desempenho com a respiração
lateral, e ritmos trifásicos de braçadas por respiração,
sendo este estilo preferido por todos os travessistas do mundo inteiro.
-
O ESTILO DAS ÁGUAS ABERTAS
A partir deste nado o que muda basicamente para o estilo de águas
abertas é a forma da respiração que volta a ser frontal
em algumas vezes, por motivos de orientação, e o "nado cego" adquirido
por alguns nadadores de travessias experientes, que seria a capacidade de nadar
por várias braçadas em uma linha reta sem ter que se orientar olhando
pra frente, um bom fator de economia de energia durante o nado.
Outro fator preponderante na técnica de nado seria a natação
de contato físico, usada por jogadores de pólo aquático,
onde se busca uma defesa de nado e manutenção da direção
com contato físico de tronco dos nadadores, proteção da
braçada e capacidade de mudança de direção rápida
em provas que hajam saídas com muitos nadadores ao mesmo tempo de um ponto
de largada e a capacidade de "esgueirar-se como uma cobra" na "floresta" dos
nadadores, em função de algumas provas que ocorra uma saída
muito concentrada de nadadores na largada.
Cabe informar aqui que provas oficiais de maratonas aquáticas
o nadador não poderia correr durante a largada e na chegada (caso de desclassificação,
se usar de impulso para prosseguir seu nado e obter vantagens), a saída
deverá ser feita de dentro d'água e a chegada também. Os
triatletas realizam largada e chegada com corrida e "golfinhadas" no
solo deixando um espetáculo de habilidade nesse sentido e diferencia-se
do proposto das travessias em que o nadador deve iniciar sua prova nadando e
terminá-la nadando também.
A largada de dentro da água inviabilizaria famosa Travessia
dos Fortes, que não teve sua versão em 2007 e não tem previsões
até o momento ainda para 2008, onde uma "massa humana" cria
um espetáculo, a olhos vistos de quem assista, na hora da largada a ponto
de acalmar as ondas do mar, enquanto ocorre à entrada de um fluxo de mais
de 3000 nadadores ao mesmo tempo no mar. Existem provas peculiares, como a Travessia
14 Bis, numa prova praticada no litoral do Estado de São Paulo, onde o
nadador pode andar no meio do percurso em função da maré baixa,
passando por comportas de um canal e o fluxo da água cria situações
interessantes, pois no transpor do percurso da prova de 40 km a correnteza é contrária
para os nadadores de ponta e favorável aos nadadores retardatários.
Em provas variadas temos também travessias noturnas que são
nadadas a noite e usa-se de tochas e fogo em pontos do percurso para nadadores
poderem orientar-se, provas de nado equipado como no caso de militares em cursos
de comandos anfíbios onde se nada com equipamento completo de combate,
provas onde se possa usar de pés de pato e snorkel em condições
de igualdade a um nadador de sunga e touca e óculos de natação
na mesma prova.
As variações de provas e comportamentos diferenciados
dos nadadores durante o percurso ficam a critério de quem organize e consiga
arrebanhar nadadores inscritos para realização da prova, mas não
estão incluídos no calendário oficial da CBDA (Confederação
Brasileira de Desportos Aquáticos) ou FINA (Federation Internationale
de Natation), embora gozem de certo prestígio e tradição
local.
- EXEMPLO
DA TRAVESSIA DO CANAL DA MANCHA
Em relatos de 1875, um capitão chamado Mattheu Webb, realizou
a primeira travessia do CANAL DA MANCHA (Inglaterra-França), desde lá existe
a Chanel Swimming Association Ltd. Temos exemplo de brasileiros tentando pela
primeira vez nadar o Canal da Mancha em 1958 (83 anos após a primeira
tentativa bem sucedida) na pessoa de Abílio Couto com tempo de 12 horas
e 45 minutos e Igor de Sousa em 1992 fazendo o percurso de ida e volta em 18
horas e 33 minutos, mostrando também que quanto maior for a dificuldade
sempre haverá pessoas comuns dispostas a enfrentarem. Muitos nadadores
deste evento sequer aparecem em listas de nadadores de destaque de provas da
CBDA ou FINA.
-
O INÍCIO DOS DESAFIOS DAS ÁGUAS
ABERTAS
O homem vem buscando na natação em águas abertas
(ou seja, travessias aquáticas) como um obstáculo a ser vencido
prestigiando o nadador como herói pelo feito.
Aos poucos e de maneira progressiva as travessias aquáticas
vêm sendo utilizadas como forma de treino aos nadadores e triatletas, seja
de experiência em provas de alto nível, como para nadadores comuns
de piscinas, sendo praticada em rios, lagos, represas, canais e praias e todas
as formas de provas aquáticas ocorrendo, cada ano que passe, uma procura
maior de nadadores por este tipo de prova seja em forma de lazer ou com intenções
de desempenho. Podem-se encontrar organizações de eventos voltados
a este tipo de público crescente onde o perfil do nadador não é o
desempenho, mas o lazer que o esporte proporciona a todo tipo de nadadores que
aprenderam a nadar na vida adulta, pessoas comuns encontram seu objetivo pessoal
em completar um determinado percurso de uma travessia realizada por poucas pessoas
no mundo e no passar dos anos.
-
INCLUSÃO
DA MARATONA AQUÁTICA COMO MODALIDADE
OLÍMPICA PARTIR DE BEIJING-2008
Quanto à questão olímpica da prova de maratona
aquática foi formalizada em 27 de outubro de 2005 em Lausanne-Suiça,
pelo Comitê Olímpico Internacional (COI), a prova de natação
em águas abertas de 10 km no programa de competição da olimpíada
de Beijing-2008 e esse novo esporte a incluído nos Jogos Pan-americanos
de 2007. Assim, criou-se um novo horizonte para atletas de alto nível
desportivo em travessias aquáticas poderem obter medalhas, somando-se
ainda as organizações que oferecem prêmios em dinheiro para
provas deste tipo em circuitos variados em várias regiões do interior
(represas, lagos e rios) e litoral (praias, ilhas, delta de rios) do país.
-
DEFINIÇÃO,
NA VERSÃO DA FINA (OPEN WATER SWIMMING)
1. Natação em águas abertas pode ser definida como qualquer
competição que se use natação em rios, lagos
ou oceanos.
2. Natação de longa distância pode ser definida como
qualquer competição em eventos aquáticos até o
máximo de 10 kilômetros.
3. Maratona aquática ou natação de maratona pode ser
definida com qualquer competição em águas abertas acima
de 10 kilômetros.
4. A idade mínima estabelecida para participar de tais eventos é de
14 anos de idade completos.
Existem vários
tipos de eventos de águas abertas além
dos estabelecidos pela FINA em que se possam
realizar provas variadas e também utilizadas
por provas de triatlo (nadadores de águas
abertas também), mas existe uma dificuldade
em definir o que seja prova de maratonas e
travessias aquáticas. Temos também
as travessias solo (ou nado solo) que não é citada
e nem definida no manual todas em águas
abertas, pois enquanto a FINA preocupa-se com
questões de segurança e acompanhamento
dos nadadores buscando critérios e procedimentos
minuciosos de segurança dos nadadores
pessoal de apoio e arbitragem, também
os desafios das travessias solo onde o mais
importante é o percurso com provas que
superam distâncias muito superiores aos
da prova olímpica, como o caso do triatlo
olímpico, que depois se tornou "Iron
man", e agora com provas de "ultra
iron man" ("iron man" ao dobro)
traduzindo o ensejo do ser humano buscando
transpor quaisquer limites que lhes seja imposto
e contrariando qualquer indicação
sensata de limites de saúde e auto preservação
da própria vida, somando-se ainda a
presença de animais que ofereçam
algum risco a saúde do nadador, como águas
vivas e tubarões.
- ÁGUAS
ABERTAS E O LAZER
A prática da natação em águas abertas
vem tornando-se um lazer para pessoas comuns que saibam nadar um pouco e em busca
da novidade da água aberta, onde o preponderante são fatores externos
intervenientes em algo que não possua uma certeza de estabilidade como
numa piscina onde tudo pode ser controlado e cercado de cuidados. O prazer da
quebra de rotina, a possibilidade do inusitado torna-se um elemento motivador
a certos nadadores onde se iniciam estudos sérios na área da psicologia
desportiva a respeito de capacidade de resistir às pressões (resiliência)
e enfrentamento (coping), pertinentes às características comuns
de personalidade de quem o pratica.
-
O QUE HÁ DE PESQUISAS
A partir do ponto de vista de que uma prova olímpica em águas
abertas exigir desempenho e capacidade aos nadadores em águas abetas,
temos também a comprovação em estudos realizados por Donato
et al (2002) em que, por estudos longitudinais sobre o pico de desempenho de
nadadores máster (femininos e masculinos), provas de piscinas nas distâncias
de 1500m e 800m estilo livre, corroborando com estudos anteriores de Tanaka e
Seals (1997) feito com resultados de nadadores de estilo livre de 1500m, onde
o tempos indicativos de boa performance revelam que em idade em torno de 30 anos
pode-se assegurar bons tempos em provas de endurance. Sinal positivo para nadadores
máster participarem de provas em águas abertas as quais são
facilmente constatadas com boa presença de nadadores máster neste
tipo de provas.
Embora haja indicativo de cautela em treinos de alta intensidade
para adultos na faixa etária acima dos 35 anos de idade segundo o I Consenso
de Petrópolis (2001), devido aos fatores de envelhecimento e retardo em
respostas que requeiram velocidade reação, ressalta que aprimoramento
técnico-desportivo afeta positivamente rendimento do atleta.
O mundo das águas abertas começa a encontrar adeptos,
seja pelo aumento da expectativa de vida da população ou por recomendações
permanentes às questões de saúde e manutenção
de uma vida saudável e ativa, requerendo informações seguras
a respeito e que possa dar treinamento adequado e manutenção de
segurança mínima em algo que sempre estará sujeito a mudanças
repentinas, por tal fato tendo um elemento não controlável, confronto
de limites, quebra de rotina em locais fechados de prática desportiva
e do fator motivador do convívio direto com a natureza, exigem uma preparação
especial do profissional que queira atuar nessa área que, além
de possuir conhecimentos básicos de preparação para endurance,
necessite de complementos em setores multidisciplinares com procedimentos de
segurança, a orientação marítima, psicologia desportiva
e biologia marinha.
- ELEMENTOS
ADVERSOS DO NADO SOLO
Embora o nadador de águas abertas se previna de todas as formas
para tal intento, deve ter consciência do que pode ocorrer consigo mesmo,
e conhecer suas conseqüências para poder decidir a continuidade da
prova o a desistência. O nadador de travessias solo deve confiar a uma
pessoa de sua total confiança o poder de decisão de manter a travessia
o desistir, pois algumas vezes não é possível haver uma
decisão somente da parte do nadador, pois há um envolvimento muito
estreito do nadador com a sua prova que não lhe permite decisões
sensatas nas circunstâncias da prova.
- Hipotermia:
É o pior inimigo do nadador, pois atua de forma silenciosa
e gradual, chegando a ponto de afetar a lucidez e a percepção do
nadador, embora haja possibilidade de se treinar adaptação ao frio,
cada ser humano possui um limiar específico e em determinados dias, por
causas diversas, pode afetar esse limiar para mais ou para menos, cabe nesse
momento o nadador se conhecer muito bem e confiar a uma pessoa essa decisão
conjunta de interrupção da prova.
- Hiponatremia:
Alguns nadadores podem ingerir demasiada quantidade de água
ao invés de complementar, com sais e glicose o que resulta em queda de
rendimento e parada da prova.
Sintomas do estado leve: cefaléia, confusão, mal-estar, náuseas,
câimbras. No estado agudo: crises convulsivas, coma, edema pulmonar,
morte."
- Ingestão de água salgada e aceleração da desidratação:
O nadador durante sua respiração, não consegue
eliminar totalmente a água que por ventura entre em sua boca, logo irá sofrer
os efeitos da desidratação acelerada em função da água
com Cloreto de Sódio, potássio, iodo, magnésio e outras
substâncias que causam diarréia, vômito, desidratação
principalmente e queda de rendimento, conseqüente abandono da prova.
- Lesão do manguito rotador:
Evento muito comum em qualquer nadador que não realize treinos
específicos de reforço da musculatura protetora de tal movimento,
em travessistas isso é muito comum,inclusive aposenta muitos nadadores
de sua carreira por lesões agravadas em função da inflamação
até o rompimento parcial ou total de tendões e inserções
de músculos inflamados.
- Ataques de animais marinhos:
Embora seja muito incomum em travessias, a presença do temido tubarão
(existem outros animais também) é um fator de desistência
da prova e/ou cancelamento da porva, por questões de segurança.
As embarcações e organização de segurança
da prova devem estar atentas a esse detalhe de importância significante
para decisão da manutenção da prova ou cancelamento
da mesma.
- Queimaduras de Águas vivas:
Esses animais possuem venenos em seus tentáculos que causam sensação
de queimadura forte e podem impedir um nadador de progredir em sua prova,
mais agravado se for alérgico, pois pode entrar em estado de choque
caso haja muitas áreas afetadas pelas queimaduras, devem ser tratadas
prontamente pela assistência médica da prova.
-
CONCLUSÃO
A prática desportiva ou de lazer em águas abertas gera
uma necessidade maior no que tange ao preparo do profissional que queira orientar
tal atividade, não bastando somente embasamento de treinos de endurance,
mas fatores ligados as propriedades do local a ser nadado, como também
elementos que lhe permitam avaliar segurança e orientação
segura e seletividade de aspectos psicológicos de seus alunos. Os poucos
estudos ligados ás águas abertas deixam lacunas de conhecimento
indispensável para dar devida segurança ao praticante de tal modalidade,
mas com o início de provas oficiais em olimpíadas (maratonas aquáticas),
em breve existirão estudos por necessidade de obtenção de
melhor desempenho dos atletas olímpicos embora não seja a única
prova que exista e a participação cada vez maior de nadadores máster
requer cuidados específicos para tal.
- REFERÊNCIAS:
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2. Fernandes, Luciano Carlos, www.educacaofisica.org, Generated: 13 January,
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3. Oliveira, Carlos Eduardo de, Hidratação esporte e atividade
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6. Lazzoli, José Kawazoe, I Consenso de Petrópolis: Posicionamento
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Donato, Anthony J. et AL, a longitudinal study in peak swimming performance
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8. Donato, Anthony J. et AL, Declines in physiological functional capacity
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94:764-769, 2003. First published Oct 18, 2002; doi:10.1152/japplphysiol.00438.2002
Comunidade do orkut: http://www.orkut.com/Community.aspx?cmm=7068204