No
Brasil têm se um conceito errado que se enfatizarmos
o treinamento tático, ir-se-átolhir o desenvolvimento
da habilidade técnica. Como o jogador brasileiro possui
grandepropensão a habilidade e pouca aplicação
tática, muitos técnicos e críticos acham
que a tática pode influenciar de forma negativa no
desenvolvimento da habilidade.
Esse conceito é extremamente equivocado, pois a qualidade técnica
aliada à organização tática trará melhores
resultados que times que só se preocupam com jogadores extremamente habilidosos,
mas que não cumprem funções táticas. Estabelecer
um padrão tático, um sistema bem organizado e treinado, em hipótese
alguma atrapalhará o improviso. O que se deve evitar é que o jogador
brasileiro use sua habilidade sem nenhuma organização e disciplina.
Muito se discute sobre qual o melhor sistema a ser empregado, se o 4-4-2; 3-5-3;
4-3-3; 3-4-3 e outros. Não existe um sistema tático mais eficiente
que outro, ou seja, não existe o esquema de jogo ideal. Todos os sistemas
podem ser eficientes, desde que bem treinados e aplicados pelos atletas. Segundo
SANTOS FILHO (2002) todos os sistemas possuem pontos positivos e negativos, o
que deu certo em uma equipe poderá não ser aplicado em outra. De
acordo com José Mourinho, citado por OLIVEIRA et. al. (2006) mais importante
do que escolher um sistema de jogo, é determinar um modelo e uma filosofia
de jogo.
O técnico deve escolher o sistema de acordo com as características
individuais do seu grupo e o nível de compreensão tática,
isso quando se trabalha com jovens atletas.
Um erro muito comum é o técnico tentar impor um sistema de jogo
muito detalhado, principalmente se o nível de compreensão das crianças
ainda é baixo para a complexidade da tarefa. Se o técnico não
entender em qual estágio maturacional seus atletas se encontram, pode
correr o risco de ter seu trabalho todo desperdiçado por falta de entendimento.
O importante num esquema tático é o equilíbrio entre os
setores ofensivo e defensivo. Não é o número de jogadores
no ataque ou na defesa que determinará esse equilíbrio e, sim a
sua disposição no campo, sua compactação e sua aplicação.
Apesar da organização tática é importante que o técnico
dê liberdade para que os jogadores possam criar e improvisar posicionamentos
e jogadas não necessariamente padronizadas pelo sistema de jogo. A rigidez
de um sistema pode em muitos casos ser a causa da ineficiência do mesmo.
O professor deve utilizar todos os métodos de aprendizagem: verbal, visual
(campo magnético; quadro branco; lousa; fotos; vídeos; transparência
etc.) e demonstração no campo.
Na implementação ou no início do trabalho tático, é importante
que o técnico estabeleça uma progressão de ensino. É importante
iniciar o trabalho com exercícios simples, sem muita exigência de
funções e complexidade.
GALLAHUE e OZMUN (2005); FREIRE (2003); BOMPA
(2002); MICHELS (2001) definem
algumas informações e características que devem ser aplicadas
em cada faixa etária:
5 anos
- O jogo é anárquico.
- Nessa faixa etária as crianças não estão preparadas
para fazer nada com as outras. A bola é dele ou dela. A visão é centrada
na bola.
- Fantasia, jogos e brincadeiras são as principais atividades.
- Quanto mais simples melhor. O futebol é complexo e o campo é muito
grande. O ideal é usar 4 X 4.
6 a 8 anos
- O jogo é anárquico.
- O campo continua muito grande e o futebol complexo.
- Não deve ocorrer especialização de posição.
- Jogos e brincadeiras como principais atividades.
- Usar 4 X 4 a 7 X 7
8 a 10 anos
- O jogo é descentrado.
- As atividades não devem ser muito diferentes da fase anterior.
- Forneça atividades para as crianças em casa ou com os amigos
da vizinhança.
- Atividades não muito diferentes da fase anterior.
- 7 X 7 deve ser a competição oficial.
10 a 12 anos
- O jogo é descentrado.
- Nessa faixa etária se inicia o trabalho de 11 X 11.
- Habilidades motoras básicas estão afirmadas.
- Aumenta o período de ensino da técnica.
- Pensamento abstrato, essencial para o aprendizado tático.
- Inicia-se a capacidade de cooperar, essencial para o jogo coletivo.
- Melhor fase para aprender movimentos, tem-se maior capacidade de concentração.
13 a 15 anos
- O jogo é estruturado.
- Trabalho de transição dos grandes espaços.
- Início de preparação física mais especializada.
- Maior intensidade em atividades competitivas.
15 a 18 anos
- O jogo é estruturado.
- Ênfase nas questões táticas. Definição clara
dos sistemas táticos e subsistemas.
- Aperfeiçoamento final nas habilidades técnicas.
- O campo visual contempla a bola, o espaço, os adversários e os
colegas.
- A comunicação entre os jogadores é verbal e motora.
A partir dos 19 anos
- O jogo é elaborado.
- Coordenação das ações táticas coletivas.
- Versatilidade das funções.
- Predominância entre os jogadores da comunicação motora.
- Visão centrada na tática.
Divide-se o trabalho tático em quatro níveis. Esses níveis
referem-se a progressão do treinamento, além disso estão
correlacionados com a periodização do treinamento, como se estabelece
um planejamento integrado: físico, técnico, tático e psicológico.
Nível 1
Nesse nível inicial o objetivo é introduzir o trabalho de futebol,
o trabalho de campo com bola. Normalmente esse nível é empregado
no início da preparação, onde o volume do condicionamento
físico é alto. O objetivo nessa etapa é mais geral. A introdução
ao sistema tático é bem geral e sem muitos detalhes. Exercícios
com baixa intensidade, baixa duração e pausa longa.
Exemplos:
•
Exercício de posse de bola, sem gol (duas ou três equipes com o
objetivo de manter a posse de bola. Pode-se variar o número de toques
na bola)
•
Posicionamento sem adversário (posicionar a equipe no sistema proposto
e definir os deslocamentos. Pode fazer esse exercício sem bola ou parando
a cada posição ou deslocamento)
•
Desenvolvimento do jogo sem adversário (no início, posicionar a
equipe no sistema proposto e desenvolver o jogo sem adversário. Aos poucos
pode-se introduzir adversários, só a defesa, depois os meias etc.
No início a marcação deve ser somente sombra, ou seja, evitando
o contato físico)
•
Mini-jogos com pouco contato (com e sem bola, com diferentes regras, números
de jogadores e tamanhos de campo)
Nível 2
No segundo nível a exigência física aliada ao trabalho com
bola e ao sistema tático proposto começa a ganhar mais intensidade
e mais especificidade. Exercícios com baixa e média intensidade,
baixa e média duração e pausa média e longa.
Exemplos:
•
Campo reduzido com baixa/média intensidade
•
Exercícios de fundamentos sem adversário (exercícios técnicos).
Nesses exercícios podem-se adotar os deslocamentos conforme o sistema
proposto
•
Movimentação ofensiva e defensiva com marcação
Nível 3
No nível 3, o trabalho com bola é intenso e complementa o trabalho
de condicionamento físico. O trabalho tático é bem específico
e todas as variantes são empregadas nessa etapa. Exercícios com
alta intensidade, média e alta duração e pausa curta e média.
Exemplos:
• Campo reduzido com diferentes regras e ritmos
•
Finalização com adversário e deslocamento
• Ataque contra defesa
•
Treino alemão (3 equipes. Duas atuam num lado do campo, quando o gol é marcado
a equipe que marcou o gol ataca a equipe que espera do outro lado do campo)
• Coletivo
Nível 4
Esse nível final compreende a verificação de todo o treinamento,
ou seja, por meio de jogos amistosos e oficiais verifica-se o resultado do treinamento
total. Atividades com altíssima intensidade, alta duração
e quase sem pausa.
Exemplos:
• Jogos amistosos, jogos-treino e jogos oficiais
O técnico e o preparador físico devem estabelecer conjuntamente
os exercícios de cada nível de acordo com a periodização
e o planejamento dos treinamentos, por exemplo, no estágio inicial do
treinamento (pré-temporada onde a carga física é maior)
deve-se adotar exercícios do nível 1 e evitar os do nível
4.
É importante observar que muitos desses exercícios podem ser aplicados
com um objetivo mais de desenvolvimento do condicionamento físico. Como
foi dito anteriormente, não se pode separar o treinamento técnico-tático
do físico.
Outro aspecto a se destacar é que os jogadores aprendam a jogar conjuntamente.
A individualidade e a técnica devem ser respeitadas, mas o objetivo comum
em conjunto deve ser a prioridade.
O futebol moderno exige equipes e jogadores competitivos. Criar atletas habilidosos é fundamental,
não se pode perder a característica do futebol brasileiro, ofensivo,
habilidoso e alegre, mas somente habilidade não torna nenhuma equipe vitoriosa. É necessário
um bom condicionamento físico e também uma equipe que apresente
um padrão de jogo com organização e disciplina. Para se
criar atletas com essa disciplina tática, dedicação, organização é necessário
que esse trabalho se inicie nas categorias de base.
Não se pode esquecer das características morfológicas, maturacionais,
desenvolvimentistas e psicológicas de cada faixa etária. O técnico
moderno deve estudar a fundo as características de cada faixa etária
para estabelecer com critério o trabalho a ser desenvolvido com as crianças
estabelecendo uma progressão do desenvolvimento tático.
Enfim, mesmo quando se fala em categoria de base, o treinamento tático é fundamental,
assim como o desenvolvimento do condicionamento fico, o aprimoramento das habilidades
técnicas e das habilidades psicológicas.
Referências:
BOMPA, Tudor O. Treinamento total para jovens campeões. Barueri: Manole,
2002.
FREIRE, João Batista. Pedagogia do futebol. Campinas: Autores Associados,
2003.
GALLAHUE, D. L.; OZMUN, J. C. Compreendendo o desenvolvimento motor: bebês,
crianças, adolescentes e adultos. Tradução de Maria Aparecida
da Silva Pereira Araújo. São Paulo: Phorte, 2001.
MICHELS, Rinus. Teambulding: the road to success. Spring City: Reedswain, 2001.
OLIVEIRA, Bruno; AMIEIRO, Nuno; RESENDE, Nuno; BARRETO, Ricardo. Mourinho: Porquê tantas
vitórias? 4. ed. Lisboa: Gradiva, 2006.
SANTOS FILHO, José Laudier Antunes. Manual de futebol. São Paulo:
Phorte, 2002.