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Dom, 3/2/13 22:13

CANOAGEM: Prevenção e auxílio no tratamento da asma

Introdução
   A asma é uma doença cercada de mitos e preconceitos, a começar pelo nome que quase sempre é evitado, por estar popularmente associado a formas mais graves de doença. Estes mitos e preconceitos a respeito da asma e seu tratamento geralmente levam pais e pacientes à procura de tratamentos alternativos e milagrosos que prometem "cura".
   Estudos recentes sugerem que a asma está se tornando cada vez mais freqüente, grave, problemática e que o número de crianças asmáticas dobrou nos últimos 20 anos. Hoje é considerada a principal causa de falta à escola e ao trabalho. Várias possibilidades têm sido aventadas para explicar esse aumento, entre elas a poluição do ar e o aumento de elementos alergênicos na atmosfera, em particular o ácaro, que encontrou um ambiente propício para sua proliferação(6). Embora a taxa de mortalidade por asma ainda seja pequena, o risco de morte por uma crise asmática é inquestionável. Em alguns países parece ter havido um aumento no número de casos fatais e os estudos realizados em busca das causas apontaram falta de tratamento adequado e preventivo, chamando-se aqui a atenção para o fato de que os asmáticos
muitas vezes são subavaliados quanto a gravidade de sua doença. A subavaliação aliada ao tratamento inadequado tem conseqüências sérias. Outro aspecto importante é a morbidade, ou seja, os prejuízos que a doença acarreta ao asmáticos. Acometidos de crises freqüentes e com baixa resistência a atividades físicas, por exemplo, os asmáticos são submetidos a inúmeras restrições que o privam do pleno desenvolvimento de suas aptidões. Com isto levam o rótulo de "criança doente", sofrendo como conseqüência a rejeição dos colegas. Mas os avanços na área do conhecimento e controle da doença, alcançados nos últimos quinze anos, tornam possível dar a 95% dos asmáticos uma boa qualidade de vida(6).
   Infelizmente, no nosso meio a asma é geralmente tratada apenas durante as exacerbações, com broncodilatadores, principalmente orais, devido ao temor aos aerosóis. Assim, os recursos relativos a terapêutica preventiva são pouco prescritos e a orientação aos programas educativos/preventivos de atividades físicas pouco indicados. Reconhecemos que os programas são poucos, baixa divulgação e que não estão ao alcance da maioria .
   Estes fatos podem explicar, pelo menos em parte, porque a asma está se tornando cada vez mais grave.

Asma e atividades físicas

   A associação da asma com alergia e atopia forneceu um modelo a partir do qual vários mecanismos fisiopatológicos têm sido demonstrados. Os processos fisiopatológicos subjacentes a essas reações têm permitido compreender melhor as complexas interações celulares dessa doença. Nesse sentido, a relação entre atividade física e asma também tem sido objeto de investigação em várias pesquisas (2,3,5).
   A asma é uma doença de evolução crônica, que muitas vezes melhora na adolescência, mas isto nem sempre ocorre, e a pessoa pode continuar a ter sintomas até a idade adulta ou durante a vida toda. De qualquer forma, a asma se adequadamente tratada não impede que o indivíduo pratique atividades físicas.    A pessoa asmática deve estar sob tratamento médico, pois a atividade física não é tratamento de asma. Para poder participar das aulas de educação física, treinos ou jogos deve-se estar com a doença bem controlada. Às vezes, mesmo que esteja bem (sem sintomas), uma atividade física intensa pode desencadear uma crise de broncoespasmo (broncoespasmo induzido pelo exercício ou BIE) 5 a 15 minutos após a realização da mesma.
   O aparecimento de sintomas (tosse chiado e/ou falta de ar, sensação aperto no peito) levam o asmático a evitar as atividades físicas com receio de que possa ter uma crise de asma ou então interromper suas atividades quando do aparecimento dos sintomas. Estas situações acabam por criar um círculo vicioso de hipoatividade física e deteriorização do condicionamento físico geral. No caso de crianças as atividades físicas são essenciais, pois proporcionam experiências básicas de movimento, importantes no seu desenvolvimento. Além disso, é através das atividades físicas que as crianças relacionam-se entre si, seja no brincar ou no engajamento em atividades esportivas, prevenindo o isolamento psico-social e melhorando a auto-imagem e auto-confiança. Na adolescência, as atividades esportivas são mais intensas e competitivas e o adolescente asmático muitas vezes sente-se preterido, considerando-se erroneamente menos capaz ou inferior. Este comportamento, acaba por levá-lo a evitar as atividades físicas e os treinamentos, tornando-o finalmente menos apto.
   Portanto, as atividades físicas devem ser incentivadas, como fator de saúde para crianças e adolescentes asmáticos. É imprescindível que os profissionais da área (professores, técnicos ou médicos esportivos) saibam orientar e incentivar seus alunos/pacientes.

Broncoespasmo induzido pelo exercício (BIE)

   Se por um lado as atividades físicas são benéficas e têm sido recomendadas, por outro lado podem ser provocadoras de broncoespasmo induzido pelo exercício (BIE). As pesquisas indicam que os exercícios físicos são provocadores de BIE em 80 a 90% dos asmáticos e em 40% dos atópicos (não asmáticos).    Outros estudos apontam a ocorrência de BIE em atletas sendo a prevalência de 10% a 14%.
   Os sintomas como tosse, dispnéia, aperto torácico e chiado após exercícios, são característicos.    Geralmente professores de educação física e técnicos esportivos confundem esses sintomas com baixa condição física. Nesse sentido, para uma adequada orientação, é fundamental um diagnóstico não só levantando a história quanto aos sintomas citados, mas também quanto a outros problemas clínicos associados, especialmente a rinite alérgica. Existem questionários, validados e de fácil aplicação, que são excelentes ferramentas para avaliação e detecção precoce do BIE (8).
   A resposta do asmático diante o exercício é diferente do não asmático. Há de se compreender que nem todas as atividades físicas provocam esse tipo de reação. Diferentes exercícios em diferentes intensidades provocam diferentes magnitudes de crises. Os exercícios podem ser classificados em mais asmagênicos (mais provocadores de crises) como a corrida e menos asmagênicos como a natação por exemplo. O exato mecanismo responsável pelo BIE é incerto, sendo que o resfriamento e ressecamento das vias aéreas na atividade física parecem ser os maiores responsáveis. Chama-se aqui a atenção para a importância da respiração nasal durante as atividades físicas. O BIE é caracterizado por uma queda de 10% a 15% no fluxo expiratório máximo. Ocorre com a duração do exercício entre 6 e 8 minutos e intensidade de trabalho de aproximadamente dois terços do consumo máximo de oxigênio (freqüência cardíaca de 170 a 180/min para crianças) (7,8).
   A resposta ao exercício aparece alguns minutos após cessado o esforço e se reverte após aproximadamente 60 minutos. Na maioria dos indivíduos o BIE consiste em uma única crise de rápido início e recuperação. Alguns podem desenvolver uma reação tardia (4 a 10 horas após o exercício). Há medicamentos muito eficientes na prevenção do BIE, como os beta 2 agonistas (broncodilatadores), cromoglicato dissódico ou nedocromil, usados em aerossóis (sprays) 10 minutos antes das atividades físicas. Estes últimos com menos efeitos colaterais (8,9).
Inúmeros fatores podem agravar o BIE como gravidade da asma, presença de obstrução nasal, tipo e intensidade do exercício físico, poluição atmosférica, temperatura e umidade ambiente, assim como, associação a determinados produtos químicos (medicamentos, conservantes, corantes, etc.).
   A obstrução nasal agrava e intensifica o BIE pela diminuição da capacidade de filtragem, pré-aquecimento e pré-umidificação do ar inalado. Embora existam inúmeras causas de obstrução de vias aéreas superiores, a mais comum e tratável é a rinite alérgica.
   No tratamento do BIE medidas farmacológicas e não farmacológicas são recomendadas.
   Na alternativa farmacológica o tratamento de escolha tem sido os beta 2 agonistas, o cromoglicato e o nedocromil, que embora estes últimos não sejam broncodilatadores mas inibem a liberação de mediadores químicos dos mastócitos, protegendo também da reação tardia ao exercício. A utilização de ambos é uma combinação eficaz.
   As estratégias não farmacológicas, que poderíamos chamar de preventivas, incluem atividades físicas de aquecimento de 10 a 15 minutos (a 50% do VO2 máx previsto para a idade), não realizar atividades em ambientes agressivos (poluição, presença de alérgenos, umidade, temperatura), evitar atividades mais asmagênicas (corrida por exemplo) e restrição alimentar (tipo do alimento e tempo de ingestão antes do exercício) (7,8,9).
   Os estudos indicam que uma boa condição física, onde ocorrem melhoras cardio-respiratórias e maior eficácia na mecânica respiratória, traduzido por melhores fluxos expiratórios, melhor ventilação pulmonar e conseqüentemente diminuição do volume residual, minimiza os impactos do BIE dando maior tolerância ao exercício físico, aumentando a capacidade de trabalho com menor desconforto e broncoespasmo (6).

Canoagem e Asma

   Para iniciar um programa de atividades físicas recomenda-se procurar compreender as funções orgânicas, principalmente aquelas diretamente envolvidas no esforço físico, de forma que o organismo trabalhe para e não contra o indivíduo. Lembrando que os asmáticos não podem ser considerados um grupo homogêneo na sua aptidão física inicial e nas suas reações fisiológicas ao exercício e que há uma variação importante em função das severidades da doença.
   As atividades físicas podem ser mais ou menos provocadoras de broncoespasmo, sendo as variáveis tipo, intensidade e duração do esforço determinantes do aparecimento e da gravidade das manifestações.    Determinadas atividades são mais fortes provocadoras como a corrida e o ciclismo, porem não devem ser totalmente evitadas, e outras tem o menor potencial de desencadear crises como a canoagem e a natação, que devem ser enfatizadas. O equilíbrio e as combinações entre as atividades com suas intensidades e durações são fundamentais, pois o asmático " sub-treinado" não obtêm benefícios e o " super-treinamento" provoca efeitos danosos.
   A Canoagem é uma excelente atividade física para os alunos/pacientes que sofrem de asma, seja como recreação e lazer ou como esporte competitivo. A principal razão para a excelência dessa atividade está na baixa asmagenicidade, ou seja, tem menor potencial de induzir o broncoespasmo através do exercício.
   Os estudos nessa área apontam que os mecanismos deste efeito não estão totalmente esclarecidos, mas os trabalhos experimentais realizados indicam os efeitos benéficos da alta umidade do ar inspirado evitando assim um dos fortes provocadores do BIE, que é o ressecamento das vias aéreas durante atividades intensas. Há uma película de evaporação constante garantindo essa umidade. Não se tem no caso da canoagem, o efeito prejudicial do reflexo do mergulho (estímulo parassimpático), encontrado na natação, que é um provocador de broncoespasmo. Outra vantagem é não haver a irritação das vias aéreas causada pelo cloro, seus derivados e outros elementos químicos usados no tratamento da água.    Portanto tem-se apenas o efeito benéfico da unidade do ar inspirado, sem os efeitos indesejáveis.    Aponta-se ainda mais uma vantagem que é o fato de nas superfícies de evaporação dos espelhos d´água ser menor a concentração de partículas inalantes em suspensão, que são alérgenos potenciais e irritantes das vias aéreas.
   Atividades físicas onde a maior concentração de trabalho é em membros superiores e executadas com ritmo, de movimentos e respiratório, são consideradas menos asmagênicas. Nesse sentido nos movimentos simétricos e ritimados das remadas reside talvez a principal vantagem da canoagem, pois são excelentes para promover eficiente movimentação dos arcos costais e articulações costo-vertebrais, proporcionando assim expansibilidade torácica e eficiência na mecânica respiratória.
   A simetria e o ritmo dos movimentos colocam o trabalho respiratório também em ritmo regular.
   A associação desses benefícios e vantagens fazem da canoagem uma prática de excelência para asmáticos e também para outros distúrbios da saúde que podem ser futuramente abordados.


Prof°. Dr°. Luzimar Teixeira
Universidade de São Paulo - USP
Instituto Punin de Informação e Referência em Asma - INSPIRA

 

 

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