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Seg, 12/1/09 16:13

FUTEBOL

DIFICULDADES ENCONTRADAS NOS PEQUENOS CLUBES DE FUTEBOL PROFISSIONAL
Prof. Ms. Fabio Aires da Cunha

   Quando vemos na televisão, nos jornais ou em revistas o sucesso alcançado por clubes como o Cruzeiro e o Santos, a idéia que nos dá é que o futebol brasileiro possui uma certa estrutura e organização, mas a realidade é bem diferente.
   Será abordado neste artigo o caso específico dos pequenos clubes do Estado de São Paulo. São Paulo é o Estado que possui a melhor estrutura futebolística do Brasil, mas está longe de ser o paraíso que muitos acreditam. O mais grave é que se a situação em São Paulo não é das melhores, no restante do país é muito pior, chegando a ser calamitosa em alguns lugares.
   Voltando ao futebol paulista, a estrutura de seu futebol compreende uma centena de clubes profissionais divididos, em 2004, em cinco divisões.
Enquanto observa-se de um modo geral nos clubes grandes e médios uma situação relativamente satisfatória, com boa estrutura e bons salários para os padrões sociais brasileiros, verifica-se nos pequenos um quadro completamente oposto.
   As dificuldades encontradas nessas equipes serão elucidadas a seguir.
Recursos Financeiros
Os clubes sofrem com a falta de dinheiro. Apesar do custo operacional, se comparado aos grandes clubes, não ser elevado, é muito difícil obter um patrocinador fixo que possa sustentar essa despesa. A cada ano que começa é uma nova batalha atraz de recursos e patrocinadores. Outro aspecto que contribui para essa falta de recursos é a inexistência ou inadimplência dos associados.

Elenco
A maioria dos clubes não consegue reunir um elenco que possa representar de forma competitiva e eficiente as aspirações dessa entidade. A cada ano que se inicia é necessário montar uma nova equipe, pois os clubes não mantêm seus jogadores ou quando muito, mantêm os jogadores da cidade. Muitos atletas ou não possuem uma boa capacidade técnica ou são completamente inexperientes. Isso acarreta enormes dificuldades ao treinador para montar uma equipe competitiva.

Material de Trabalho
O material utilizado para a realização do trabalho, que inclui bolas, uniformes de treino, cones, chuteiras, estacas etc., são fatores de fundamental importância na elaboração e realização de um programa de treinamento em qualquer clube de qualquer divisão. Bolas sem qualidade ou em quantidade inferior ao necessário; o mesmo com os uniformes de treino, que em muitos casos são utilizados ano após ano; falta de cones, estacas e cordas. É a realidade encontrada em muitos desses clubes. Existem casos de treinos que precisam ser cancelados ou alterados pela falta ou inexistência de alguns desses itens.

Acomodações
O alojamento é outro item que merece um destaque especial. Existem alojamentos com baixas condições de higiene; chuveiros sem água quente; iluminação inadequada; colchões velhos e estragados; inexistência de locais para os atletas estudarem, lerem ou se reunirem e, falta de locais para recreação, como sala de jogos.
Verificam-se casos de atletas que apresentam dores nas costas por dormirem em colchões estragados, ficam doentes por dormirem em locais úmidos e frios etc.

Alimentação
De fundamental importância para o desenvolvimento de um atleta profissional, a alimentação normalmente não é adequada e assustaria qualquer nutricionista da área esportiva. A variação dos alimentos, como frutas e verduras, normalmente não acontece. O preparo dos alimentos também não é da maneira mais indicada. É muito comum serem alimentos gordurosos e com muita fritura. Normalmente, os empregados responsáveis pelo preparo dos alimentos não estão preparados tecnicamente para fazer a alimentação de um atleta.
As condições de higiene da cozinha também estão longe das ideais. Se a vigilância sanitária fizesse uma fiscalização, a grande maioria delas seria fechada.
A alimentação desses atletas não é satisfatória em quantidade, mas principalmente em qualidade. Falando em qualidade é quase inexistente o uso de suplementos como vitaminas, aminoácidos etc.

Viagens
Com as longas distâncias existentes dentro do Estado de São Paulo, muitas equipes precisam viajar mais de dez horas para realizar uma partida. Em alguns casos as equipes chegam ao local do jogo, no dia da realização do mesmo, isso após viajarem cinco, seis horas. Os atletas dormem e descansam dentro do ônibus. O rendimento certamente será afetado.
Muitos desses ônibus não possuem a mínima condição para realizar esse tipo de viagem. São ônibus velhos e desconfortáveis. Uma curiosidade é que o ônibus quebrar durante o trajeto é uma situação comum enfrentada por essas equipes.

Instalações, Locais de Treinamento e Estádios
A prática mais comum é treinar no próprio estádio. Como foi elucidado anteriormente, os clubes não possuem recursos para alugar campos para treinar e muito menos possuem um centro de treinamento próprio.
Observam-se também campos de treinamento e jogo sem as mínimas condições, com gramados irregulares e esburacados; vestiários sem condições de higiene e espaço.
Os estádios são outros locais que não atendem as exigências do Estatuto do Torcedor. Não existem locais numerados; sinalizações adequadas; sanitários limpos e em funcionamento; conforto mínimo; segurança etc.

Salários
Esse é um aspecto que beira ao ridículo quando se trata de uma profissão, um esporte profissional e o maior esporte no Brasil. A falta de pagamento de salários ou benefícios é uma prática comum, isso porque os salários são baixos, próximos ao salário mínimo nacional. Muitos profissionais não são registrados ou o são com um valor irrisório.
A desculpa de que o clube não tem dinheiro para pagar altos salários, como acontece nos grandes clubes, não pode ser aceita, pois como já foi dito os salários são baixos.
Em parte, o problema dos baixos salários é culpa dos próprios profissionais que acabam aceitando qualquer proposta só para ter a oportunidade de trabalhar em um clube profissional. Com isso, não valorizam seu trabalho e muito menos sua profissão.

Recursos Humanos
Enquanto os grandes clubes têm treinador; preparador físico; auxiliares; médico; roupeiro (mordomo); enfermeiro (massagista); fisiologista; fisioterapeuta; assistente social e psicólogo, os pequenos possuem em muitos casos o mínimo, um treinador, um preparador físico, um enfermeiro, um roupeiro e só. Isso quando alguns poucos não assumem várias funções. Mais uma vez a desculpa é a situação financeira.
Outro problema é a falta de capacitação dos profissionais. Com baixos salários e falta de condições de trabalho, os profissionais que atuam nesses clubes, em muitos casos, não possuem capacitação adequada para o cargo que exercem e a responsabilidade que o mesmo exige.
Observam-se treinadores que não conduzem treinos adequadamente ou são verdadeiros ditadores com métodos de treinamento completamente ultrapassados; preparadores físicos que não evoluíram com os métodos científicos mais modernos e também utilizam métodos de treinamento defasados, isso sem falar de enfermeiros e roupeiros, normalmente indivíduos da própria cidade que precisam trabalhar, mas não possuem conhecimento para a função que exercem.
Os dirigentes deveriam buscar contratar profissionais realmente capacitados para as funções necessárias. Verificar a experiência e o conhecimento desse profissional, assim como é feito em qualquer empresa quando precisa contratar um novo profissional.

Dirigentes
Assim como em alguns grandes clubes, nos pequenos também vemos casos de dirigentes praticamente vitalícios e sem capacitação.
Existem dirigentes que não conhecem a realidade do futebol no século XXI e não se preocupam nem um pouco com a situação dos membros da comissão técnica e dos atletas.
A inexistência de dirigentes profissionais é outro fator que influencia negativamente na administração dos clubes. Os clubes são administrados de forma ultrapassada e amadora. A falta de um trabalho de marketing e de divulgação é um aspecto que atrapalha na obtenção de patrocínios, mas muitos desses dirigentes chegam a desconhecer o significado da palavra marketing.

Política
Assim como em todas as áreas no nosso país, os pequenos clubes de futebol também são influenciados pela política local. A escolha de dirigentes, de patrocinadores e até de participação em alguns torneios, podem sofrer influência de interesses políticos.

Categorias de Base
Quando aqui se fala em categoria de base, refere-se a escolinha, infantil (sub-15) e juvenil (sub-17), pois o juniores (sub-20) além de ser uma categoria quase profissional, todos os clubes do Estado de São Paulo são obrigados a disputar o Campeonato Paulista dessa categoria.
Com a falta de recursos financeiros, os clubes praticamente não investem na base e a grande maioria nem possui equipes dessas categorias. O pior é que os clubes não enxergam que uma das soluções para os problemas financeiros é justamente investir nos garotos. Já que não possuem dinheiro para contratar bons jogadores, a solução seria formá-los dentro de casa.
O que se vê são jogadores com idade de juniores que não possuem experiência, pois quando eram infantis e juvenis não disputaram torneios competitivos.
Novamente, volta-se a desculpa da falta de recursos. Enfatizo que um trabalho de marketing eficiente e direcionado poderia angariar recursos locais para esse trabalho, até porque é um trabalho de baixo custo operacional.

Educação
Não existe um projeto para a educação dos atletas. Muitos abandonam a escola por preguiça ou por acharem que não podem estudar e ser atleta ao mesmo tempo. Existe um total despreparo e desinteresse por parte dos dirigentes com relação à educação de garotos e adultos.
O lado social dos atletas também é deixado de lado. Muitos atletas apresentam problemas de conduta e convívio em grupo, chegando a ocorrer casos de furto e homossexualismo. O mais grave é que os clubes não demonstram interesse em ajudar a solucionar ou minimizar esses problemas.

    Muitos garotos ao assistir a televisão e ver o sucesso alcançado no exterior por jogadores como Ronaldo, Kaká, Cafu, Roberto Carlos, Ronaldinho Gaúcho, Dida e outros, acabam se iludindo e não sabem a grande dificuldade que existe no início de carreira, principalmente em um clube pequeno. Esses garotos abandonam a escola pela chance de vencer no futebol, mas apenas uma minoria atinge o sucesso, a maioria infelizmente não consegue. Muitos acabam em subempregos e até na marginalidade, pois não se prepararam ou não foram devidamente orientados para buscar alternativas fora do futebol.
    Acredito que a verdadeira profissionalização dos pequenos clubes somente ocorrerá com a mobilização conjunta dos Conselhos Regionais de Educação Física; prefeitos; empresários locais; dirigentes profissionais, capacitados e honestos; membros da comissão técnica com capacitação, conhecimento, devidamente preparados e credenciados em seus conselhos profissionais.
    Quero salientar que essa situação é encontrada na maioria dos clubes, mas não em todos. Existem pequenos clubes que possuem uma boa estrutura, dirigentes e profissionais capacitados. A situação é que muitas equipes, infelizmente, estão falidas e sem uma liderança forte e competente. Encontram-se também clubes que alternam anos de total despreparo e falta de condições, com anos de boas condições e bom trabalho.
    O futebol é uma paixão de nosso povo. Os clubes e seus dirigentes deveriam respeitar o cidadão que torce por uma bandeira ou distintivo e, principalmente, respeitar aqueles que procuram honestamente vencer por meio do futebol, inclui-se treinadores, preparadores físicos, atletas e demais profissionais.


Janeiro/2004

 

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